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Capoeira Psicomotora – Parte II

A primeira parte deste texto comparou a semelhança das principais linhas de trabalho da Psicomotricidade com a Capoeira, no entanto, faltou abordar a relação dos principais componentes do desenvolvimento psicomotor com a prática desta arte-luta.
A criança que inicia na Capoeira tem o seu repertório motor aumentado automaticamente, pois ela aprende a utilizar o seu corpo de formas diferentes da vida cotidiana, ao mesmo tempo ela consegue se identificar com esta nova maneira de se movimentar e isso ocorre devido à liberdade e a ludicidade que a capoeira desperta em cada criança. Os movimentos que, muitas vezes, são reprimidos no ambiente doméstico ou escolar são permitidos na capoeira, sendo assim, levantar as pernas bem alto, rolar, virar de cabeça para baixo, usar as mãos no chão, cantar ou batucar, são ações que toda criança quer e sabe, cada uma a seu modo, realizar, mas não tem coragem, liberdade ou oportunidade de fazer.
Literalmente, o que toda criança quer é ser criança e a única forma de fazer isso é estimulando o seu desenvolvimento psicomotor e a melhor ferramenta que se tem é a brincadeira espontânea, mas nos dias atuais esta ferramenta tem sido pouco utilizada, por inúmeros fatores, por isso, algumas crianças tem maior ou menor facilidade para se movimentar e se expressar. Como a capoeira está repleta de aspectos simbólicos (lúdicos) e favorece a comunicação corporal ela se torna uma prática aliada da Psicomotricidade porque estimula os componentes do desenvolvimento psicomotor que são: coordenação motora global, coordenação motora fina, lateralidade, noção espaço- temporal, esquema corporal, imagem corporal.
A tão falada coordenação motora global, também conhecida como ampla ou geral, agrega os demais componentes do desenvolvimento psicomotor a partir do recrutamento dos grandes grupos musculares, ou seja, através de uma grande organização corporal é possível construir esta coordenação utilizando exercícios combinados e dissociados, danças e atividades de expressão corporal. A Capoeira possibilita tudo isso. Se na simples imitação do jogo de Capoeira, a criança estimula a construção da sua coordenação motora global pode-se imaginar os seus benefícios sobre este componente se a prática for organizada e devidamente orientada;
A coordenação motora fina também é amplamente estimulada pela prática da Capoeira, em especial pelo manuseio com os instrumentos musicais e dentre eles o berimbau torna-se o maior responsável pelo desenvolvimento desta coordenação devido à maneira de segurar, em forma de pinça, a baqueta (vareta) e a pedra (ou dobrão) em cada uma das mãos simultaneamente e vale lembrar que a escrita da criança dependerá dos estímulos de coordenação motora fina que ela recebe;
Através do manuseio dos instrumentos observa-se que a lateralidade, também, é estimulada, além da execução de todos os fundamentos para ambos os lados, que é uma prática comum nas aulas de Capoeira.
Se as noções de direita e esquerda causam dúvidas em muitos adultos podemos imaginar como as crianças ficam confusas quando, ainda, não possuem uma dominância lateral estruturada, por isso a praxia simultânea em ambas as mãos ou pernas permite à criança organizar sua atividade motora experimentando ora direita, ora esquerda sem imposição da destralidade;
A noção espacial refere-se ao espaço ocupado pelo corpo, pela sua localização e dominância e a roda de Capoeira proporciona experiências como entrar e sair, interagir, interferir e dividir este espaço com outros corpos. A criança aprende sobre a forma da roda e a localização de cada componente como a organização da bateria, o pé do berimbau (ou da cruz), o lugar de cada colega nesta roda e a direção em que os movimentos devem ser projetados. Todos estes aspectos estimulam, naturalmente, a organização espacial do jovem capoeira. A noção de espaço está intimamente ligada à noção de tempo partindo da ideia de que o corpo movimenta-se num espaço (roda) por determinado tempo (jogo).
A noção de tempo, assim como a noção de espaço, se constrói mentalmente, de forma abstrata por isso é tão difícil para a criança entender a ordem dos acontecimentos e como a estruturação do tempo está associada à noção de sucessão, portanto, intimamente ligada ao ritmo que é composto pelas noções de ordem, sucessão e duração.
E em que outra modalidade, além da capoeira, estas noções poderiam ser tão estimuladas simultânemente?
A começar pelas palmas, a criança aprende a bater palmas em, pelo menos, três cadências diferentes, dependendo do estilo musical de cada grupo, além disso, não só o jogo, mas toda a aula de Capoeira é realizada ao som da sua música característica que pode ser lenta ou rápida. A criança aprende que para estabelecer o diálogo corporal da Capoeira ela precisa perguntar com um movimento (ataque) e aguardar a resposta do colega que será outro movimento (esquiva) e o processo pelo qual esta conversa se estabelece é totalmente psicomotor e espaço-temporal.
Quanto à contribuição da Capoeira para com o esquema corporal pode-se dizer que o aumento no repertório motor da criança faz com que ela tome consciência da funcionalidade das partes do seu corpo, já que a construção do esquema corporal não pode ser ensinada, pois ela ocorre através das experiências corporais que a criança tem.
Mas com relação à imagem corporal, que é a imagem mental que a criança possui de si, a Capoeira influencia, principalmente, no aspecto social. Todo iniciado deseja vestir-se como o restante do grupo, ter um cordão como os alunos mais adiantados ou deseja movimentar-se como o seu professor (mestre), desta forma a criança constrói imagens para fazer parte de algo, para ser aceita. A imagem corporal se estrutura a partir das vivências afetivas da criança a partir do seu corpo em movimento ou não.
E sem entrar em maiores detalhes, como não dizer que a capoeira é psicomotora?

Fonte: Portal da Educação Física

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