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Capoeira Psicomotora – Parte I

A Capoeira é um dos maiores tesouros que o Brasil possui no seu aspecto cultural, toda a história da afro-descendência deste povo pode ser contada por esta arte, através dos seus rituais, da sua musicalidade e dos seus movimentos. Por isso a Capoeira é uma ferramenta tão importante no contexto educacional.
No que diz respeito à Educação Infantil, séries iniciais e Educação Especial a Capoeira como prática corporal se torna um forte agente de estimulação psicomotora porque a Capoeira é psicomotora e esta afirmativa é válida devido aos aspectos que a capoeira tem em comum com a Psicomotricidade.
Durante a infância a criança necessita vivenciar o seu corpo das mais variadas forma e ela já o faz naturalmente, se assim o meio em que vive permitir. A criança em seu comportamento motor característico costuma saltar, rolar, andar sobre quatro, três, dois e um apoio, a criança se alonga de formas variadas, inventa cantigas que remontam o seu cotidiano, adoram instrumentos de percussão devido à simplicidade que existe em criar um som com as suas próprias mãos como bater palmas, sacudir um chocalho, bater num balde, num pandeiro ou atabaque, para a criança é algo fácil, natural e instintivo.
Os principais componentes do desenvolvimento psicomotor são, naturalmente, estimulados pela Capoeira porque ela permite liberdade e criatividade corporal.
Podemos correlacionar tais componentes e linhas psicomotoras com os fundamentos da Capoeira como, por exemplo, no que diz respeito à relação adulto/criança e quanto à proposta que cada ferramenta oferece.
Em Terapia Psicomotora a relação do psicomotricista com a criança se faz por meio de ajuda, escuta, interação e disponibilidade corporal e o mesmo tipo de relação pode e deve ser estabelecida entre o instrutor de capoeira e as crianças que estão sob seus cuidados, porque para que a aprendizagem da capoeira seja efetiva em crianças pequenas é necessário que o professor crie uma relação de confiança com os pequenos ouvindo suas histórias, auxiliando nos movimentos mais difíceis ou que dão medo de realizar, além de permitir que o seu corpo seja o alvo dos golpes (martelos, bênçãos e cabeçadas) desajeitados dos pequenos. E na proposta de trabalho da Terapia Psicomotora são utilizados objetos e o corpo do psicomotricista como depósito das emoções da criança e com a Capoeira não é diferente, os instrumentos musicais, a própria musicalidade e objetos como o cavalete ou raquetes de outras artes marciais que podem ser usadas na capoeira para treinar, especialmente os chutes, canalizando, assim, a agressividade contida. Quanto ao corpo, muitas vezes a criança sente uma enorme necessidade de vencer o adulto que o instrutor de capoeira pode representar para ela naquele momento de sua vida, de repente ele deixa de ser o Tio da Capoeira para ser, simbolicamente, qualquer outro adulto da vida desta criança que lhe reprime como parentes ou outros professores.
Também podemos encontrar na Educação Psicomotora Funcional características comuns à prática de uma aula de capoeira. Nesta linha psicomotora a relação adulto/criança é menos íntima, pois o adulto funciona como um líder, um modelo para criança demonstrando os exercícios a serem realizados por ela, isso ocorre devido à herança que a Psicomotricidade carrega da Educação Física tradicional e em extinção, enfim, numa aula de capoeira para crianças do Ensino Fundamental, geralmente é assim que os fundamentos são passados, o professor demonstra e o aluno imita seus movimentos para depois serem feitos na tradicional roda. Na proposta da Psicomotricidade Funcional, o psicomotricista utiliza as famílias de exercícios conhecidos da citada Educação Física tradicional como saltar, rolar, arrastar, correr, escalar, pendurar, carregar, lançar e pegar em comparação com a Capoeira, nas aulas, alguns professores se utilizam destes padrões motores para complementar o treino, no entanto como humilde conhecedora desta arte-luta acredito que todos os seus movimentos mais tradicionais como a ginga, a negativa, cocórinha, queda de quatro, meia lua de compasso são originários das famílias e exercícios, o povo que criou a Capoeira primitiva baseou tais movimentos na sua herança motora e atividades do seu cotidiano nas plantações de café e cana, então saltar, agachar, rolar, escalar foram adaptados pelo instinto e defesa e sobrevivência de um povo oprimido, mas são movimentos que já estavam registrados na nossa filogenia.
E por fim temo a Educação Psicomotora Relacional, nesta linha a relação do psicomotricista com a criança é semelhante a da Terapia Psicomotora onde além de ajuda, escuta e interação há também estímulo e intervenção e na prática da capoeira, assim como em qualquer outra atividade corporal a criança necessita de um mediador que a estimule nos movimentos mais difíceis e que intervenha quando algo sair do controle, geralmente o “mestre de capoeira” tem esse perfil paternalista do tipo severo e afetivo ao mesmo tempo e quanto as característica da proposta de trabalho da Psicomotricidade Relacional podemos utilizar o jogo de capoeira propriamente dito para fazer a correlação, pois na PR encontramos o ritual de entrada e de saída, que apesar de ser verbalizado, é uma espécie de acordo sobre o que poderá acontecer na sessão e sobre o que aconteceu na sessão, enquanto que na capoeira o ritual de entrada e saída é não verbal, mas entendemos como um acordo de que nada ruim aconteça durante o jogo. Encontramos, também, a musicalidade que dá ritmo a brincadeira (jogo livre). A atividade livre e de expressão é a brincadeira em si, que na Psicomotricidade Relacional se faz através do diálogo corporal (comunicação não verbal) com alguns materiais clássicos da Educação Física como arcos, bolas, cordas, além do outro, na verdade estes materiais servem como mediadores para que uma relação simbólica seja estabelecida entre as crianças e apesar de não utilizarmos esses materiais no jogo da capoeira, utilizamos o diálogo corporal com o outro e essa é uma característica que difere a capoeira de outras artes-lutas, a capoeira é jogada com o outro e não contra outro. Ocorre um jogo simbólico, um faz de conta de ataque e defesa, de gracejo e expressão de sentimentos sem nada dizer, é um brinquedo, como se dizia antigamente, um brinquedo de Angola, pois acredita-se que foram os escravos de origem angolana que a descobriram, enfim na Capoeira não temos a habilidade de decodificação dos comportamentos e sentimentos apresentados pelas crianças durante a sua prática e isso o Psicomotricista Relacional sabe fazer e poderia fazer ao analisar um jogo de capoeira, mas que cada um utilize os recursos que tem para facilitar o processo e desenvolvimento psicomotor de nossas crianças.

Fonte: Portal da Educação Física

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